Jonas e Eu
Nubia
Nogueira Cesari Aguila
O Chamado
O
chamado é a força motriz. A razão do homem está em viver por algo. O que
importa é encontrar um propósito, saber aquilo que Deus realmente quer que eu
faça. Responder o chamado do Criador é “o porquê afinal da vida”.
Segundo
Guiness, ao descobrir o chamado, o indivíduo é capacitado a descobrir o que ele
realmente é, e libertar-se daquilo que não era. E ele afirma que, ao aceitar
tal chamado, Deus se torna o farol seguro adiante dele e também um fogo
abrasador em seu interior. Por esta razão, o chamado é a motivação mais
profunda da experiência humana. E a minha experiência começou no dia oito de
maio de 1984, quando entreguei a minha vida para Jesus e comecei um
relacionamento com meu Salvador.
O povo da deficiência invisível
Fui
atraída por um povo com a deficiência invisível. Uma comunidade que “aparentemente
não tinha nada a compartilhar comigo”, tinha uma língua diferente,
aparentemente nervoso e estranho, mas no meu âmago sentia que este era o meu
chamado. Então comecei a estudar a língua, a identidade deste povo e foram
muitas as descobertas.
A língua brasileira de sinais – Libras possui
parâmetros que servem ao estudo da aquisição da linguagem pelo deficiente
auditivo que não são os mesmos da pessoa ouvinte. A criança surda, mesmo não
sendo exposta a nenhum tipo de linguagem sinalizada, desenvolve espontaneamente
um sistema de gesticulação manual.
Quadros
(2004) descreve que a Libras como toda língua de sinais é uma modalidade
gestual-visual, pois utiliza movimentos gestuais e expressões faciais que são
percebidas pela visão. Os sinais são formados a partir de combinações do
movimento das mãos com um determinado formato em um determinado lugar, sendo
este lugar uma parte do seu corpo ou um espaço em frente ao corpo. Estas
articulações das mãos, que podem ser comparadas aos fonemas e às vezes aos
morfemas, são chamadas de parâmetros, portanto, a Libras possuem os seguintes
parâmetros: configuração das mãos (CL), ponto de articulação (PA), movimento
(M), orientação das mãos (Or), expressão facial (EF) e / ou corporal (EC). A
combinação destes parâmetros tem-se o sinal. “A língua de sinais brasileira,
assim como as outras línguas de sinais, é basicamente produzida pelas mãos,
embora movimentos do corpo e da face também desempenhem funções. Seus
principais parâmetros fonológicos são locação, movimento e configuração de mão”
(QUADROS, 2004, p.51).
Uma
língua carregada de herança histórica e rica, com uma beleza cinestésica
incomparável. Com ela pode-se transmitir, criar e recriar o que quiser poesia,
romance, filosofia, etc.
A
Libras constitui idioma com estrutura própria e, portanto, são codificadas de
uma “visão de mundo“ específica. Apresenta uma gramática de especificidades em
todos os níveis, fonológico, sintático, semântico e pragmático, embora, em suas
estruturas subjacentes utilizem-se de princípios gerais similares ao da língua
oral. Por possuir um caráter diferente do que qualquer língua falada ou
escrita, não é possível transliterar uma língua falada para a língua de sinais
(palavra por palavra ou frase por frase), pois sua estrutura é essencialmente
diferente.
Souza
(2007) diz que 95% das crianças surdas nascem em famílias ouvintes. A notícia
da deficiência obriga a família a rever seus sonhos e expectativas em relação à
criança. Esse processo de aceitação da surdez significa uma insegurança, pois
os pais estavam “preparados” para receber uma criança ouvinte, mas quando
deparam com o nascimento de uma criança surda eles pensam que a surdez impede a
criança de se comunicar, portanto, tentam fazer essa tarefa, apesar de não
estarem preparados para tal. A comunicação é uma das mais importantes
necessidades da vida humana e a escola aparece como elemento facilitador no
enfrentamento das dificuldades de comunicação, pois é nela que as famílias têm
acesso à aprendizagem da Libras. A língua de sinais é o caminho por meio do
qual a criança surda pode desenvolver suas necessidades linguísticas, pois a
surdez leva a criança a um isolamento dentro da própria família. Essa falta de
comunicação no convívio familiar priva a pessoa com esta deficiência de
situações de diálogo, o que o leva a expressar comportamentos tidos como
agressivos ou inadequados. A criança surda deve ter o contato com a língua de
sinais o mais cedo possível.
O profetismo Israelita
Os
profetas são os anunciadores da Palavra de Deus, eles sabem ler a história
porque foram chamados pelo Deus da história. Profeta é o homem que vê para onde
a história vai. A missão de um profeta é convocar as pessoas a viverem bem, da
forma certa, a serem verdadeiramente humanos numa relação íntima com Deus. “Eles davam testemunho, transmitiam
conhecimento, explicavam sua mensagem. Em sua caminhada o profeta passa a não
somente receber o conhecimento dos planos de Deus sobre a história, mas lhe são
imputados, como por transferência; certos estados afetivos do coração do
próprio Deus: a cólera, o amor, a compaixão, a repugnância, etc. Eles foram
vítimas acirradas de zombarias, rejeição, injustiças. Enfrentaram tempos de
derrotismo, momentos de fadigas, desesperos. Tudo isso porque não se modelavam
e nem conformavam com o mal vigente”(Texto: Renata Arruda).
Jonas
era um profeta independente, pois exercia sua vocação longe do
profissionalismo, e sim, por causa de um chamado especial que desloca de seus
afazeres.
Como
Jonas, tive que aprender que o relacionamento especial de Deus com o seu povo
não é exclusivista, mas inclusivista. Como que um povo que não ouve poderia
“ouvir” a voz daquele que o criou? A resposta é simples, utilizando as mãos
daqueles que se dispõe a se entregar Aquele que tudo pode fazer.
Análise do livro de Jonas
O
nome Jonas significa “poma”. Nasceu em Gate-Hefer, perto de Nazaré. Portanto,
Jonas era galileu. Profetizou no Reino do Norte durante a época de Jeroboão II,
rei de Israel, no séc. VIII a. C. Predisse a expansão territorial conseguida
por esse soberano(IIRs 14:25-27).
O
livro de Jonas começa com a ordem de Javé a Jonas para profetizar contra a
perversa Nínive, capital do império Assírio que naquele tempo, seus exércitos
ameaçavam Israel. Em vez de ir para o leste, rumo à Assíria, Jonas embarcou num
navio para Társis – em direção oposta para “longe da presença do Senhor”, pois
sabia que Deus era clemente e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em
benignidade, e que se arrepende do mal.
Javé
extraiu a moral contrastando o interesse egoísta de Jonas pela planta e a
compaixão divina por suas criaturas em Nínive, “mais de cento e vinte mil
pessoas, que não sabiam discernir entre a mão direita e a mão esquerda, e
também muitos animais” (Jn 4:11).
Jonas
está determinado a fugir da ordem de Deus, mas Deus está infinitamente mais
determinado a fazê-lo obedecer.
A
negação da missão principal de Jonas provoca tempestades, turbilhões, vazios
existenciais. Jonas é, pois, um livro que nos faz pensar e sonhar. Pensar e,
talvez, até mesmo chorar pelo que somos, e então, sonhar, com o que poderemos
vir a ser.
Segundo
Soraya Cavalcanti, no livro “Mergulho no Ser”, Jonas é cada um de nós com
nossas dificuldades e ambiguidades, com aquelas contradições que frequentemente
colocam em xeque o que falamos.
Abraham
Moslow, diz que ser atingido pelo complexo de Jonas, é experimentar o medo da
própria grandeza. Com isso compreendemos que não é suficiente reconhecer o que
há de grande, de bom, de digno em nós, mas o que Deus quer manifestar por meio dessa
possível grandeza. Essa possibilidade de se deixar usar por Deus, muitas vezes
nos assusta e nos faz fugir.
A fuga: a
fuga para Társis, símbolo do lugar em que me escondo de mim mesmo e de Deus! O
lugar do descompromisso, o lugar de nos escondermos dos perigos que rondam o
amor.
O medo:
Jonas é um homem de muitos medos. Pode-se considerar que o livro de Jonas é o
livro da Travessia dos medos. Sua leitura leva-nos até as Palavras do Apóstolo
João: “O perfeito amor lança fora todo medo” (IJo 4:18). O contrário do amor,
não é ódio, e sim medo de amar!
No navio:
Jonas é o símbolo do homem que quer permanecer deitado, adormecido em si mesmo.
Durante a tempestade ele dormia um sono profundo, parecia um ser atemporal,
impenetrável.
Agostinho
diz que é no encontro comigo mesmo, que percebo a minha necessidade do outro, E
quando me encontro com o outro, amplio a visão de mim mesmo.
Toda
missão tem um preço. Jonas foge do compromisso, da entrega e do esforço.
Lançado no mar: A
oração de Jonas. Nesse momento de intimidade, sua maior necessidade é
reconstruir sua identidade a partir da imagem de Deus. O fio de vida para ele
naquele lugar escuro, úmido e apertado, o leva a ser íntimo de Deus (Jn 2:7).
Seu
relacionamento com Deus é superficial, ele não consegue entender os propósitos
do coração de Deus. Através do amor, misericórdia e insistência, Deus quebra os
medos e preconceitos que atormentavam Jonas.
O desfecho:
Deus pediu duas coisas ao povo de Nínive – que orassem a Ele e se desviasse de
suas maldades. Os ninivitas creram na pregação de Jonas, eles se arrependeram e
se humilharam diante de Deus. Por causa do arrependimento genuíno, Deus reteve
sua mão de julgamento até um tempo posterior.
Os
ninivitas creram na mensagem pregada por Jonas, arrependeram-se da sua
impiedade e humilharam-se diante de Deus! Por causa do arrependimento genuíno
deles, Deus reteve sua mão de julgamento até um tem tempo posterior.
O
mesmo Deus tem feito pela comunidade surda através da minha vida há vinte e
nove anos (19 anos na igreja da minha conversão e há 10 anos em Lagoinha). Os
tempos são difíceis, a vontade desistir sempre bate à porta, mas toda vez que
penso em desistir lembro-me de uma palavra que o Pr. Gustavo Bessa disse uma
vez que o “nosso chamado é irrevogável”. Também me lembro de uma frase que a
professora Cleonice Russo disse na sala “Ministério é uma chamada incrível a
uma pessoa inadequada para fazer uma obra impossível por um tempo determinado”.
Muitas vezes (quase sempre) me sinto inadequada, não capacitada. Como Jonas dá
vontade de tomar uma direção contrária, bem longe do local de onde tenho que
desenvolver meu chamado. Mas o maior problema não está na comunidade surda, mas
infelizmente dentro do próprio ministério, dentro da própria igreja. Pessoas
que lutam por poder, de querer se colocar em evidência, fazendo assim do
Ministério um campo de batalha.
A
Igreja da Lagoinha tem sido benção, uma Igreja com mais de 200 ministérios
trabalhando na diversidade, mas ela ainda não tem sido uma igreja inclusiva,
mas sim uma Igreja que tem integrado várias pessoas com deficiências. A Igreja
é leiga no assunto inclusão. Mas ela está caminhando. A inclusão visa numa
adaptação da Igreja, estrutura, povo de Deus se adaptar para receber de braços
abertos as pessoas com deficiência.
O
alvo de Lagoinha é 10% da cidade de Belo Horizonte até 2020, e temos que
lembrar que não só 10%, mas toda a cidade são nossas ovelhas. Hoje no Brasil,
segundo o censo do IBGE (2010) 9,7 milhões de pessoas tem algum tipo de
deficiência auditiva e sei que cabe a nós, a mim, esclarecer à minha liderança
sobre essa necessidade. Planejar, buscar estratégias e servir.
Referência:
DE
QUADROS, Ronice Muller; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais
brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.
DE SOUZA, Regina Maria (org.) et al.
Educação de surdos: pontos e
contrapontos. São Paulo: Summus, 2007.
SEUBERT,
Augusto. Como entender a mensagem dos
profetas: introdução pastoral aos profetas. São Paulo: Edições Paulinas,
1992.
Texto
da Renata Arruda “O chamado”.
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